terça-feira, 18 de dezembro de 2018

PRECEDENTE, SÚMULA E JURISPRUDÊNCIA


NOÇÕES CONCEITUAIS
Por: Dulce Anne Freitas Feitosa[1]

No Brasil, com a universalização e democratização do acesso à justiça, a partir da CF/1988 houve uma explosão de litigiosidade antes reprimida pelo regime ditatorial, ensejando a judicialização em massa dos conflitos[2]
Então, para se assegurar a isonomia, confiança e segurança jurídica, surge no Brasil o sistema de precedentes que ganhou relevo e impulso no cenário jurídico nacional com a EC no 3/1993[3], quando instituída a Ação Declaratória de Constitucionalidade – ADC, e com ela o efeito vinculante das decisões proferidas pelo STF, efeito esse estendido às decisões do STF nas Ações Diretas de Inconstitucionalidade - ADIn, através do art. 28, parágrafo único, da Lei 9.868/1999[4]
O CPC/2015 introduziu o conceito de precedentes no direito brasileiro. Precedente é um pronunciamento judicial proferido em processo anterior que é empregado como base da formação de outra decisão judicial, prolatada em processo posterior. 
O estudo sobre o sistema de precedentes judiciais no CPC/2015 deve ser precedido das noções de jurisprudência, súmula e precedente, pois  o sistema brasileiro de precedentes é construído para que haja uniformidade de decisões em causas idênticas[5]


Entretanto, a instabilidade da jurisprudência no Brasil existe por notória razão histórica: a certeza e a previsibilidade do ordenamento jurídico pátrio decorrem da lei[6] (sistema civil law).
Jurisprudência é o conjunto de decisões concordantes proferidas  por órgãos judiciários (tribunais), em relação à mesma questão, de modo reiterado e uniforme, com força persuasiva no sistema jurídico[7]
A jurisprudência pressupõe a multiplicidade de decisões e existência de vários casos concretos. São exemplos que podem ou não ser seguidos; é o produto do debate acerca da matéria, podendo conter teses opostas ou convergentes entre as unidades que compõem o conjunto[8]
A jurisprudência classifica-se, em sentido amplo, como um conjunto de decisões independentemente do sentido que tais decisões dão a uma determinada matéria; e, em sentido estrito, entendida como um conjunto de decisões uniformes acerca da mesma matéria. 
A jurisprudência se caracteriza em atividade de interpretação da lei desempenhada pelas cortes para solução de casos, cuja múltipla reiteração gera a uniformidade capaz de servir de parâmetro de controle, não gozando, todavia, de autoridade formalmente vinculante[9]
Jurisprudência não se confunde com precedente. Juraci Mourão Lopes Filho bem explica: “precedente é uma resposta isolada a um caso concreto, que pode ser utilizado para casos futuros diante da similitude hermenêutica. Já a jurisprudência, justamente por significar a reiteração de uma resposta hermenêutica em várias situações, não necessita de similaridade entre os casos”[10]
As súmulas têm origem nos assentos portugueses e massimas  italianas. Súmulas são resumos editados das teses vencedoras integrantes da jurisprudência predominante de determinado tribunal sobre temas controvertidos em determinado momento. 
Na compreensão tradicional, as súmulas constituem meio para ordenar e facilitar a tarefa judicante de controle da interpretação e aplicação do direito no caso concreto, não gozando igualmente de força vinculante[11]
Agora, aplicam-se sentidos inovadores aos termos jurisprudência e súmula porquanto funcionam como guias para a interpretação do direito[12], para o sistema de administração da Justiça Civil como um todo e para a sociedade civil em geral.
Trata-se de instituto de relevância ímpar na aplicação e efetivação do Direito, pois o precedente projeta seus efeitos jurídicos para o futuro, condicionando o comportamento de distintos sujeitos em casos similares, revelando seu caráter normativo[13]
Essas são as noções introdutórias que devem nortear o estudo sobre precedentes judiciais.



[1] Dulce Anne Freitas Feitosa é Assessora do Tribunal de Justiça da Bahia, Mestranda em Direito pela UFBA, Pós graduada em Direito e Processo do Trabalho pela UNIJORGE (2004), Professora e Diretora Acadêmica da Faculdade Social Sul Americana (FASS).
[2] CAMBI, Eduardo; FOGAÇA, Matheus Vargas. Sistema dos precedentes judiciais obrigatórios no novo Código de Processo Civil. In Precedentes. Coordenadores Fredie Didier Jr. et Al. Coleção grandes temas do novo CPC, v.3. Coordenador geral: Fredie Didier Jr. Salvador: Juspodivm, 2015, p. 335-360.
[3] Emenda Constitucional no 3, de 17 de março de 1993. Altera os arts. 40, 42, 102, 103, 155, 156, 160, 167 da Constituição Federal. Art. 1.o Os dispositivos da Constituição Federal abaixo enumerados passam a vigorar com as seguintes alterações: ... Art. 102. ....... I - ....... a) a ação direta de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo federal ou estadual e a ação declaratória de constitucionalidade de lei ou ato normativo federal; § 1.o A argüição de descumprimento de preceito fundamental, decorrente desta Constituição, será apreciada pelo Supremo Tribunal Federal, na forma da lei. § 2.o As decisões definitivas de mérito, proferidas pelo Supremo Tribunal Federal, nas ações declaratórias de constitucionalidade de lei ou ato normativo federal, produzirão eficácia contra todos e efeito vinculante, relativamente aos demais órgãos do Poder Judiciário e ao Poder Executivo
[4]  Lei 9.868/1999: Art. 28. Dentro do prazo de dez dias após o trânsito em julgado da decisão, o Supremo Tribunal Federal fará publicar em seção especial do Diário da Justiça e do Diário Oficial da União a parte dispositiva do acórdão. Parágrafo único. A declaração de constitucionalidade ou de inconstitucionalidade, inclusive a interpretação conforme a Constituição e a declaração parcial de inconstitucionalidade sem redução de texto, têm eficácia contra todos e efeito vinculante em relação aos órgãos do Poder Judiciário e à Administração Pública federal, estadual e municipal.
[5] CÂMARA, Alexandre Freitas. O novo processo civil brasileiro. 2 ed. SP: Atlas, 2016, p. 428.
[6] BARREIROS, Lorena Miranda Santos. Estruturação de um sistema de precedentes no Brasil e concretização da igualdade: desafios no contexto de uma sociedade multicultural. In Precedentes. Coordenadores Fredie Didier Jr. et Al. Coleção grandes temas do novo CPC, v.3. Coordenador geral: Fredie Didier Jr. Salvador: Juspodivm, 2015, p. 183-213
[7]  MONNERAT, Fábio Victor da Fonte. A jurisprudência uniformizada como estratégia de aceleração do procedimento. In Direito Jurisprudencial. Coordenadora: Tereza Arruda Alvim Wambier. SP: RT, 2012, p. 345
[8] SHIMITZ, Leonard Ziesemer. Compreendendo os “precedentes "no Brasil: fundamentação de decisões com base em outras decisões. SP: Revista de processo, n. 226, dezembro/2013, p. 353
[9] MITIDIERO, Daniel. Precedentes. Da persuasão à vinculação. SP: RT, 2017, 2 ed e-book baseada 2 ed impressa.
[10] LOPES FILHO, Juraci Mourão. Os precedentes judiciais no constitucionalismo brasileiro contemporâneo. Salvador: JusPodivm, 2014. 11 LOPES FILHO, Juraci Mourão. Os precedentes judiciais no constitucionalismo brasileiro contemporâneo. Salvador: JusPodivm, 2014, p. 127
[11] 12 MITIDIERO, Daniel. Precedentes. Da persuasão à vinculação. SP: RT, 2017, 2 ed e-book baseada 2 ed impressa.
[12] MITIDIERO, Daniel. Precedentes, jurisprudência e súmulas no novo código de processo civil brasileiro. Revista de Processo, vol. 245/2015, julho/2015, p. 333 – 349.
[13] ROSITO, Francisco. Teoria dos precedentes judiciais: racionalidade da tutela jurisdicional. Curitiba: Juruá, 2012, p. 92.

Um comentário:

  1. Olá, gostei muito do conteúdo !
    https://blog.advocaciamariapessoa.com.br/

    ResponderExcluir