segunda-feira, 3 de dezembro de 2018

DOCUMENTO PARTICULAR ASSINADO PELO DEVEDOR


A DISPENSA DAS ASSINATURAS DAS TESTEMUNHAS E 
A TEORIA DO TÍTULO DE CRÉDITO

Prof. Dulce Feitosa[1]


Tema de debates acirrados nos tribunais é o da teoria do título de crédito extrajudicial. Aqui, interessa destacar a eficácia do documento particular assinado tão somente pelo devedor, sem as assinaturas das testemunhas instrumentárias[2].

Fazendo uma incursão pelo rol dos títulos de créditos extrajudiciais, extrai-se do art. 784, III, do CPC, que é título de crédito extrajudicial o “documento particular assinado pelo devedor e por 2 (duas) testemunhas”.

Na ausência do agente público, o documento particular feito e assinado, ou somente assinado pelo devedor e por duas testemunhas instrumentárias, supre o documento público, demonstrando-se as obrigações convencionais de qualquer valor, todavia os seus efeitos, bem como os da cessão, não se operam, a respeito de terceiros, antes de registrado no registro público, ex vi art. 221, do CC.

É assente o entendimento jurisprudencial no sentido da dispensa das testemunhas do documento particular fazerem-se presentes ao ato de sua formação, o que não lhe retira a executoriedade, uma vez que as assinaturas podem ser feitas em momento posterior ao ato de criação do título executivo extrajudicial, sendo as testemunhas meramente instrumentárias (Precedentes do STJ: REsp 1.127/SP; Resp 8849/DF, Rel. Min. Nilson Naves, j.  28/5/1991).

A questão que se pretende realçar cinge-se, contudo, à eficácia do documento particular assinado pelo devedor que esteja na livre disposição e administração de seus bens (art. 221, CC), sem as assinaturas das duas testemunhas instrumentárias e, ainda assim, revelar-se como documento com força executiva, hábil a aparelhar uma ação de execução de título executivo extrajudicial.

O STJ firmou entendimento no sentido de que as assinaturas das duas testemunhas caracterizam-se como requisito extrínseco à substância do ato, cuja finalidade é o de conferir a existência e a validade do negócio jurídico, razão pela qual o instrumento particular que não contenha a assinatura das duas testemunhas não preenche os requisitos legais, não autorizando, portanto, a utilização da via executiva para a cobrança do crédito nele inscrito (Precedentes do STJ: AgRg nos EDcl no Ag 927128/SP, Rel: Min. Vasco Della Giustina, Des. convocado do TJ/RS, j. 07/12/2010, DJe 17/12/2010; AgRg no REsp 1235799/SP, Rel: Min. Maria Isabel Gallotti, j. 25/11/2014, DJe 10/12/2014).
Todavia, substancial parcela da jurisprudência daquela Corte Superior, tem assente que para a caracterização do documento particular como título executivo, dispensa-se a assinatura das testemunhas, que não precisam ter assinado o documento contemporaneamente ao devedor e que a falta de identificação das testemunhas ou o fato de estarem as suas assinaturas ilegíveis não afeta a higidez do título executivo (Precedentes do STJ: REsp 159747/SP. Rel. Min: Barros Monteiro, j: 18/10/2005, DJ 12/12/2005; REsp 541.267/RJ, Rel. Min. Jorge Scartezzini, j. 20.09.2005; REsp 225.071/SP, Rel. Min. Fernando Gonçalves, j. 01.04.2004; REsp 137.895/PE, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, j. 20.10.2005).

         Nesse contexto, a conclusão que se chega é a de que o Superior Tribunal de Justiça tem mitigado a exigência legal quanto à assinatura das testemunhas instrumentárias, admitindo o documento particular assinado tão somente pelo devedor como título executivo hábil a aparelhar ação de execução extrajudicial, em especial se, do exame do caso concreto, não houver negativa da transação celebrada, nem impugnação ao ajuste objeto da execução.


[1] Dulce Feitosa é servidora pública do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia, Mestranda em Direito pela UFBA, pós graduada em Direito do Trabalho e Processual do Trabalho pela UNIJORGE (2004), Diretora Acadêmica e Professora de Direito Processual Civil da UNIFASS.
[2] Denomina-se testemunha instrumentária a que subscreve o instrumento contratual, ou convencional, sem com isso implicar necessariamente que o tenha firmado à época da celebração. Caio Mário da Silva Pereira conceitua testemunhas instrumentárias com “estranhos ao negócio jurídico que assinam o instrumento juntamente com as partes, em garantia de que houve o ato tal como redigido, e que foi efetivamente por elas firmado. Denominam-se por isso mesmo de testemunhas instrumentárias. (PEREIRA, Caio Mario da Silva. Instituições de Direito Civil, Vol. 1, Ed: Forense, Rio de Janeiro, 1991, p. 420)

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