Prof.
Milton Vasconcellos[1]
No cabedal dos paradoxos jurídicos que representa a relação jurídica tributária no Brasil sabe-se bem porque se tributa, mas certamente, não se sabe bem por que se paga em oposição à frase “não sei porque bato, mas ele sabe porque apanha”.
Valho-me, entretanto,
desta frase para identificar um dos muitos paradoxos dentro do sistema
tributário tupiniquim, formalmente intitulado Sistema Tributário Nacional,
repleto de absurdos e paradoxos que fazem da tributação algo tão ou mais
difícil de entender por que se bate ou se apanha.
Dentre tantos exemplos,
destaco a FEASPOL (Fundo Especial de Aperfeiçoamento dos Serviços Policiais)
criado pela lei estadual 6895/95 em substituição ao antigo FUNRESPOL (Fundo
Especial de Reequipamento Policial). Trata-se de um tributo da espécie taxa,
que é cobrada toda vez que a Polícia exerce seu poder de polícia (polícia
administrativa) ou pela prestação de serviços específicos e/ou diferenciados na
área de segurança pública e fiscalização do cumprimento da legislação
administrativa policial, nos termos da citada lei.
Trocando em miúdos,
toda vez que a Polícia é utilizada para prestar um serviço de fiscalização ou
exercer poder de polícia em área de segurança pública é devido o tributo nos
termos da lei estadual 6895/95 citada.
Muito justo que seja
cobrado. Afinal é um serviço público prestado a um particular. Logo deve mesmo
haver a remuneração. Ademais da receita recolhida, segundo a lei estadual, há a
finalidade de reequipamento de material das Polícias Civil e Militar, além de
ser uma compensação dos encargos adicionais de pessoal, encargos estes que
representam gratificação especial (equivalente a 30% (trinta por cento) dos recursos
do Fundo) aos servidores civis e militares que desempenham as tarefas citadas.
Dessa forma, toda vez
que os trios elétricos vão desfilar no Carnaval, há antes uma fiscalização
feita pela SSP (Secretaria de Segurança Pública), mediante dentre outros,
pagamento da FEASPOL. Ou ainda, toda vez que na capital há jogos entre a dupla
BAVI, as duas maiores respectivas torcidas são escoltadas pela Polícia Militar,
que cobra a taxa FEASPOL.
Muito justo – repito –
pois como se pode ver nestes dois casos citados, há a prestação de serviços
públicos específicos e divisíveis a um particular.
A questão, contudo,
torna-se complexa quando o destinatário deste serviço é o próprio Estado, como
nos casos em que o Estado realiza operações para verificação de pagamento de IPVA
e faz uso de força policial.
Observe que a atividade
enquadra-se como poder de polícia tendo portanto perfeita subsunção quando a
realização de abordagem dos veículos é feita por policiais – fato aliás
bastante corriqueiro em Salvador – com vistas exclusivamente a identificar se o
IPVA foi pago (nestes casos o policial limita-se a solicitar o documento do
veículo para verificar se o veículo está licenciado, e por consequência IPVA
pago). Tal atividade não é serviço de interesse da Polícia Militar mas sim da
Secretaria da Fazenda Estadual que deveria usar seu pessoal para tanto, tendo a
força policial quando solicitada uma atuação secundária, uma espécie de
garantia, para os casos necessários.
Logo, nestes casos está
o policial exercendo poder de polícia decorrente da fiscalização do cumprimento
da legislação administrativa, verificando-se assim perfeita subsunção à taxa
FEASPOL, uma vez que ele estaria desempenhando um serviço específico e
divisível.
Logo, além da eventual
sanção ainda estaríamos pagando pelo “serviço prestado”, haja vista que, sendo
um tributo, apesar de ser um receita derivada, continua sendo pública e, o
destinatário do serviço é o Estado que nada mais é que nós mesmos.
Não se alegue por fim
que, por ser um tema de interesse do próprio Estado ele poderia lançar mão do
argumento da imunidade recíproca de tributos, haja vista que neste caso a regra
imunizante aplica-se apenas à espécie tributária “imposto”, sendo perfeitamente
cabível a cobrança da taxa. Ademais, não pode o Estado abrir mão desta receita
pois que nos termos da lei estadual citada, um percentual da arrecadação (30%
trinta por cento) pertence ao policial pelo serviço prestado.
O Estado neste caso
utiliza-se da Polícia para fazer tais aferições, cobra o IPVA e eventualmente
aplica multas e outras sanções (como apreensão do veículo por falta de
pagamento) e todo serviço é custeado por receita pública (paga pelo próprio
apenado), assim ao contrário do afirmado no início do texto o Estado pode até
não saber por que bate, mas certamente todos nós contribuintes sabemos porque
apanhamos.
E como apanhamos.
[1] Milton Vasconcellos é Advogado,
Especialista em Direito Público (FABAC), Professor de Direito Tributário e de
Hermenêutica da Faculdade Apoio Unifass.
Pois é!
ResponderExcluirGostaria que ouvesse o mesmo empenho enquanto a proteção do cidadão.
Assim também como ter revertida adequadamente o imposto ao que se destina, pois ao contrário do que estamos cansados de ver, nossos dias na estrada, estão cada vez mais longos. Abraços mestre.