quinta-feira, 24 de setembro de 2015

TAXA PARA ATIVIDADES FÍSICAS NA PRAIA


VAI MALHAR NA PRAIA? 
TEM DE PAGAR TAXA!
Por: Milton Vasconcellos[1]
A Câmara Municipal de Salvador aprovou no início desse mês uma lei que visa regulamentar a prática de exercícios em espaços públicos prevendo ainda uma taxa de exploração do espaço para o município de Salvador.
A proposta é polêmica e desde já gera repúdio de diversos matizes, dos quais, interessa-nos apenas o ângulo tributário da citada taxa que se quer criar. Sobretudo considerando a legislação já existente do município de Salvador.
Espécie tributária prevista no art. 145, II da CFRB, a taxa é um tributo vinculado, quer dizer, é de sua natureza o caráter contraprestacional, sendo devida a prestação de serviços públicos pelo valor pago a título de taxa. Desta realidade, divide-se a taxa em dois tipos: as taxas de serviço: (devidas pela prestação de um serviço público específico e divisível) e as taxas de polícia (devidas pelo exercício do poder de polícia). Tais delimitações constitucionais expressam os limites do legislador ordinário, que só pode criar novos tributos dentro dos limites determinados pelo Constituinte.
Por tal razão, a cobrança de uma nova taxa, pressupõe a perfeita adequação aos limites citados, ou em outros termos a cobrança de uma nova taxa implica na prestação de um serviço público (específico e divisível) ao contribuinte ou o exercício do poder de polícia. Dito isso, indaga-se: qual serviço público é prestado ao contribuinte quando se usa uma praia para realização de atividades físicas?
Desta pergunta, segue-se outra:


Ainda que exista tal serviço prestado este é feito especificamente ao contribuinte (serviço uti singuli) ou prestado à comunidade em geral (serviço uti universi)? A indagação é importante, pois apenas será devida a taxa pela prestação de serviço uti singuli, sendo todos os demais custeados por impostos.
Por outro lado, defende-se a citada taxa, sob a alegação de que seria uma taxa de polícia, cobrada nos termos da já conhecida taxa de licença para Exploração de Atividades em Logradouros Públicos, cujo fato gerador é o licenciamento obrigatório, bem como a sua fiscalização, quanto ao cumprimento das normas concernentes, ordem, tranquilidade e segurança pública, consoante previsto no art. 145 da Lei n.º 7186/06 (Código Tributário e de Rendas do Município de Salvador).
O que chama a atenção é que este mesmo Código já prevê a possibilidade de taxa para o uso de atividades esportivas realizadas em praias dentro do município, consoante se pode observar no art. 145, § 1, VI do Código Tributário e de Rendas do Município de Salvador:
Art. 145. A Taxa de Licença para Exploração de Atividades em Logradouros Públicos – TLP, fundada no poder de polícia do Município, quanto ao uso dos bens públicos de uso comum e ao ordenamento das atividades urbanas, tem como fato gerador o licenciamento obrigatório, bem como a sua fiscalização, quanto ao cumprimento das normas concernentes, ordem, tranquilidade e segurança pública. §1° Para os efeitos deste artigo são atividades exploradas em logradouros públicos as seguintes:
[...]
VI - atividades recreativas e esportivas, inclusive as realizadas nas praias do Município;
A guisa da previsão já existente, o já citado Código prevê ainda algumas hipóteses de isenção, previstas no art. 150, in verbis:
Art. 150. São isentos da taxa:
I - o vendedor ambulante de jornal e revista
II - o vendedor de artigos de artesanato doméstico e arte popular de sua própria fabricação sem auxílio de empregado
III - cegos, mutilados, excepcionais, inválidos e deficientes físicos, que exerçam individualmente o pequeno comércio ou prestação de serviços
IV - meios de publicidade destinados a fins religiosos, patrióticos, beneficentes, culturais, ou esportivos somente afixados nos prédios em que funcionem;
V - placas, dísticos de hospitais, entidades filantrópicas, beneficentes, culturais ou esportivas somente afixadas nos prédios em que funcionem;
VI - cartazes ou letreiros indicativos de trânsito, logradouros turísticos e intinerário de viagem de transporte coletivo
VII - atividade de caráter religioso, educativo ou filantrópico, de interesse coletivo, desde que não haja qualquer finalidade lucrativa e não veicule marcas de empresas comerciais ou produtos
VIII - Sindicatos, Federações e Centrais Sindicais;
IX - as Organizações Não Governamentais, sem fins lucrativos, declaradas de Utilidade Pública.
Parágrafo único. Fica o Poder Executivo autorizado a conceder isenção da taxa a eventos culturais ou desportivos apoiados institucionalmente pela Prefeitura.
Destas atividades listadas, destaca-se os incisos três e nove, bem com o parágrafo único quando prevê a isenção para cegos, mutilados, excepcionais, inválidos e deficientes físicos (desde que exerçam individualmente o pequeno comércio ou prestação de serviços) e as Organização Não Governamental, sem fins lucrativos, restando claro que se tais treinos forem feitos por estas pessoas, estariam elas beneficiadas pela regra isentiva.
Por fim, cita-se ainda, o parágrafo único a prever a possibilidade do Município pode eventualmente afastar a incidência da taxa se o evento for apoiado institucionalmente pela Prefeitura.
Dessa forma, ao se postular criar uma nova Lei prevendo taxa sobre idêntico fato gerador já existente, o Município na prática cria um subterfúgio para “driblar” as isenções já existentes, haja vista que com o novo Projeto de Lei -  que certamente não irá prever as isenções citadas do art. 150 - tais normas não seriam mais aplicáveis, uma vez que nas hipóteses de isenções a lei determina obrigatória regra de interpretação literal prevista no art. 111, CTN, afastando-se assim a interpretação extensiva das isenções citadas para a nova taxa pretendida pelo Município.
Em síntese: a possibilidade de se cobrar taxas pelo uso de espaços públicos (como praias) para treinos físicos já é hipótese de incidência da Taxa de Licença para Exploração de Atividades em Logradouros Públicos, criada pelo Município de Salvador. Dessa forma ao se criar uma nova taxa com idêntica hipótese de incidência, na prática, o Município estaria apenas burlando todo o citado art. 150 e as hipóteses de isenção já previstas.





[1] Milton S. Vasconcellos é Advogado, Pós graduado em Direito do Estado pela FABAC, Professor de Direito Tributário e de Hermenêutica Jurídica do Curso de Direito da Faculdade Apoio Unifass (Lauro de Freitas).


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