Por:
Milton S. Vasconcellos[1]
Realizado no dia
13/09/15, a prova de segunda fase de Direito Tributário trazia o seguinte
enunciado na questão 2:
Questão
2 - A União ajuizou execução fiscal em face da pessoa jurídica ABC Águas Ltda.
e de João, diretor da pessoa jurídica, cujo nome estava indicado na certidão de
dívida ativa (CDA), para a cobrança de valores relativos ao Imposto sobre a
Renda (IR), supostamente devidos. De acordo com a União, a atribuição de
responsabilidade ao Diretor estaria correta, tendo em vista o inadimplemento do
tributo pela pessoa jurídica. Diante desse caso, responda aos itens a seguir.
A)
A inclusão de João na CDA como responsável tributário, em razão do mero
inadimplemento do tributo pela pessoa jurídica ABC Águas Ltda., está correta?
(Valor: 0,60)
B)
Caso a execução fiscal tivesse sido ajuizada somente em face da pessoa
jurídica, a União teria que demonstrar algum requisito para a inclusão do
Diretor no polo passivo da execução fiscal? (Valor: 0,65)
Ao que interessa ao
questionamento que ora se propõe, resta valortar a resposta trazida ao item b:
B)
O examinando deve destacar que, se a execução tivesse sido proposta somente em
face da pessoa jurídica, havendo indicação do nome do Diretor na CDA, a União não teria de provar a presença dos
requisitos do Art. 135 do CTN, tendo em vista a presunção relativa de
liquidez e certeza da CDA, conforme o Art. 3º da Lei 6.830/80 e/ou o Art. 204
do CTN. (negritei e sublinhei)
Data máxima vênia, mas
entendemos que a União devia provar sim os requisitos do art. 135, III, CTN
para fins de aferição da responsabilidade tributária do sócio da pessoa
jurídica, sendo insuficiente a afirmativa trazida pelo enunciado da presunção
de certeza de liquidez e certeza da CDA (certidão de Dívida Ativa).
Afirma-se isso, pois como
se sabe, prevalece no direito brasileiro a teoria da autonomia patrimonial das
pessoas jurídicas que, dotadas de personalidade jurídica própria, tem plena
responsabilidade pelos seus atos.
Em matéria tributária, a
questão não é diferente e uma vez praticado fato gerador, cabe o dever pelo
pagamento do tributo à pessoa jurídica, sendo a possibilidade deste dever estendido
aos sócios da pessoa jurídica, quando atendido os requisitos trazidos pelo art.
135, III, CTN:
Art. 135. São pessoalmente responsáveis
pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias resultantes de atos
praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou
estatutos:
[...]
De plano, pode-se
observar no inciso III que não é qualquer sócio que pode responder pelas
dívidas tributárias da pessoa jurídica, mas sim aqueles que possuam algum tipo
de poder de gerência (Diretores, gerentes ou representantes de pessoas
jurídicas de direito privado), razão pelo qual, sendo sócio minoritário
(normalmente despidos de poder de gerência) nunca haverá responsabilidade
tributária.
Um segundo aspecto diz
respeito ao caput do citado artigo: a responsabilidade dos sócios decorre dos
atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou
estatutos, sem a qual não há que se falar em responsabilidade dos sócios. Em
outras palavras, não basta ser sócio da empresa e dispor de poder de gerência,
faz-se necessário comprovar que sua atuação extrapolou seus poderes previstos
no contrato social (caso a empresa seja uma LTDA) ou Estatuto (caso seja uma
S.A.).
Esta tese é corroborada
por uma série de precedentes do STJ e até mesmo pela Súmula nº 430 do Superior
Tribunal de Justiça:
Súmula nº 430, STJ
- O inadimplemento da obrigação tributária pela
sociedade não gera, por si só, a responsabilidade solidária do sócio-gerente.
De outro lado, observe-se
que a presunção da CDA é do tipo Juris
tantum, podendo, portanto, ser relativizada, motivo pelo qual tal presunção
só ocorre quando da inscrição em dívida ativa, não podendo ser invocada pela
autoridade administrativa como forma de suprir o ônus de prova do sujeito
passivo quando da ocorrência do fato gerador e sua respectiva imputação por
subsunção ao contribuinte (ou responsável).
Tratando-se de responsabilidade
tributária, o STJ, entretanto, já chegou a posições polêmicas acerca da
responsabilidade solidária do sócio-gerente da pessoa jurídica por ocasião da
dissolução irregular presumida da empresa, ainda assim quando deixa de
funcionar no seu domicílio fiscal, sem comunicação aos órgãos competentes,
consoante entendimento já sumulado pelo Superior Tribunal de Justiça:
Súmula 435 - Presume-se
dissolvida irregularmente a empresa que deixar de funcionar no seu domicílio
fiscal, sem comunicação aos órgãos competentes, legitimando o redirecionamento
da execução fiscal para o sócio-gerente.
De se notar, portanto,
que a hipótese indicada no enunciado da questão 2, letra B no XVII Exame da Ordem
dos Advogados do Brasil não vislumbra nenhuma das hipóteses indicadas, motivo
pelo qual a responsabilidade do Sócio na hipotética questão trazida pela prova
apenas seria possível se comprovados os requisitos indicados pela lei (art.
135, III, CTN).
Esperemos, portanto, que
a Banca volte atrás e reveja a resposta publicada, evitando-se assim prejuízos
aos candidatos e consequentes recursos que certamente serão feitos, caso se
insista nesse gabarito.
[1] Milton S. Vasconcellos é Advogado,
Pós graduado em Direito do Estado pela FABAC, Professor de Direito Tributário e
de Hermenêutica Jurídica do Curso de Direito da Faculdade Apoio Unifass (Lauro
de Freitas).
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