Mudança
de entendimento do STF:
LEI QUE REVOGA ISENÇÃO
DEVE SE SUBMETER AO PRINCÍPIO
DA
ANTERIORIDADE TRIBUTÁRIA
Prof.
Milton Vasconcellos[1]
O princípio da
anterioridade tributária é uma garantia constitucional voltada ao contribuinte
prevista no art. 150, III, b, CFRB expressando que uma vez editada uma lei que
cria ou majora um tributo, esta só deve ter aplicação no próximo exercício
financeiro (que no Brasil representa o próprio ano-calendário).
Pois bem, a questão que
sempre foi celeuma entre a doutrina era seguinte: revogada uma isenção isso
poderia ser considerado como “criação de um tributo” doravante? Se sim, estaria
tal situação condicionada ao princípio da anterioridade, devendo assim a
cobrança só ser feita no próximo exercício financeiro?
Para o STF, ao menos até
abril de 2009, a resposta que não. A lei que revoga isenções não deve se
submeter ao princípio da anterioridade, haja vista que não há violação à não surpresa da tributação uma vez que o tributo já era
existente, devendo portanto ser exigido imediatamente o tributo. Essa era a
posição do STF por ocasião do julgamento da ADI 4016.
Neste
sentido, veja-se a ementa
1.
Alteração de dispositivos da Lei nº 14.260/2003, do Estado do Paraná, a qual
dispõe sobre o Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores - IPVA.
2.
Alegada violação ao art. 150, III, alínea b, da Constituição Federal.
3.
A redução ou a extinção de desconto para pagamento de tributo sob determinadas
condições previstas em lei, como o pagamento antecipado em parcela única, não
pode ser equiparada à majoração do tributo em questão, no caso, o IPVA.
Não-incidência do princípio da anterioridade tributária. 6. Vencida a tese de
que a redução ou supressão de desconto previsto em lei implica, automática e
aritmeticamente, aumento do valor do tributo devido.
(STF
- ADI: 4016 PR , Relator: Min. GILMAR MENDES, Data de Julgamento: 01/08/2008,
Tribunal Pleno, Data de Publicação: DJe-075 DIVULG 23-04-2009 PUBLIC 24-04-2009
EMENT VOL-02357-01 PP-00047 RDDT n. 165, 2009, p. 187-193)
Não se olvida que a ADI
julgada pelo Pleno do Tribunal vincula também o Poder Judiciário, inclusive as
Turmas do STF, motivo pelo qual é defensável ainda a permanência do
entendimento sufragado pelo ADI, porém não se pode deixar “em branco” o julgamento do RE-564225,
onde o STF começa a ver o tema por outro ângulo, onde se concluiu que a
revogação da isenção configura
aumento indireto de tributo estando portanto sujeita ao princípio da
anterioridade tributária, devendo portanto ser exigida apenas no próximo
exercício financeiro.
Nesse sentido:
RECURSO EXTRAORDINÁRIO
ICMS BASE DE CÁLCULO MAJORAÇÃO ANTERIORIDADE PRECEDENTE NEGATIVA DE
SEGUIMENTO. 1. O Estado da Bahia insurge-se contra acórdão por meio do qual o
Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul afastou a aplicação dos Decretos
estaduais nº 39.596 e nº 39.697, ambos de 1999, que promoveram a majoração da
base de cálculo do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços ICMS
devido por prestadores de serviços de televisão por assinatura, para o ano de
publicação, assentada a possibilidade de surtirem efeitos, em razão do
princípio da anterioridade tributária, apenas a partir de 1º de janeiro de
2000. A decisão impugnada não merece reparos. Os atos infralegais implicaram
aumento indireto do imposto, porquanto revelaram redução de benefício fiscal
vigente, devendo ser observado, também nesses casos, o princípio da anterioridade.
(STF - RE-564225 RS , Relator: Min. MARCO
AURÉLIO, Data de Julgamento: 04/12/2013, Tribunal Pleno, Data de Publicação: DJe-249 DIVULG 16/12/2013 PUBLIC 17/12/2013
EMENT VOL-02357-01 PP-00047 RDDT n. 165, 2013, p. 186-199)
Acertada a decisão do Tribunal.
Como se sabe, a garantia do princípio da
anterioridade assegura a “não-surpresa” da tributação, objetivando assim garantir que o contribuinte
não seja surpreendido com aumentos súbitos do encargo fiscal, mas
se de um lado é possível argumentar que o contribuinte isento já conhecia do
tributo, por outro, com a revogação da isenção ele terá de organizar-se
doravante para suportar esse novo ônus, o que em um país com uma das mais altas cargas tributárias do mundo, pode
implicar até mesmo no fechamento de empresas, sobretudo as micro e pequenas
que, por sinal são as que mais oferecem empregos.
Sob o
ponto de vista técnico, não restam dúvidas que a revogação da isenção (ou
qualquer outro benefício fiscal) não implica numa majoração de tributos, mas
quando considerado seu resultado prático, há inequívoco agravamento da situação
do contribuinte a exigir portanto direito implícito e inafastável ao planejamento
tributário. Com tal decisão o STF passa a considerar o conteúdo teleológico do
princípio da anterioridade como balizador de sua aplicação, bravo!
[1] Milton Vasconcellos é Advogado,
pós graduado em Direito Público (FABAC). Professor da Faculdade Apoio Unifass
(Lauro de Freitas-Ba).
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