A PROVA PRÁTICA PROFISSIONAL DE
DIREITO TRIBUTÁRIO
XIV Exame da OAB
Prof.
Milton Vasconcellos[1]
Realizada no dia
14/09/14, a segunda fase do tão temido Exame da OAB, chega às minhas “mãos“
(na verdade, me foi enviado por e-mail por um aluno) a referida avaliação com o
enunciado da questão prática, bem como as quatro questões subjetivas de direito
material.
De imediato, cumpre destacar: foi uma prova tranqüila. Afirmo isso não por que sou professor dessa disciplina, mas sim porque – ao contrário de outros exames – não vi nenhuma “pegadinha”, nenhum “terrorismo”. O nível de exigência foi razoável, dentro do que se espera para alunos graduados ou em vias de se graduar em Direito.
Para confirmar o que digo, ponho-me a comentar ao menos a questão do cabimento da peça prática exigida neste exame. Para tanto faz-se necessário, citar o enunciado da questão aplicada na prova de hoje:
Em março de 2014, o Estado A instituiu,
por meio de decreto, taxa de serviço de segurança devida pelas pessoas
jurídicas com sede naquele Estado, com base de cálculo correspondente a 3%
(três por cento) do seu faturamento líquido mensal. A taxa, devida
trimestralmente por seus sujeitos passivos, foi criada com o objetivo de
remunerar o serviço de segurança pública prestado na região. A taxa passou a
ser exigível a partir da data da publicação do decreto que a instituiu. Dez
dias após a publicação do decreto (antes, portanto, da data de recolhimento da
taxa), a pessoa jurídica PJ Ltda. decide impugnar o novo tributo, desde que sem
o risco de suportar os custos de honorários advocatícios na eventualidade de
insucesso na demanda, tendo em vista que pretende participar de processo
licitatório em data próxima, para o qual é indispensável a apresentação de
certidão de regularidade fiscal, a qual será obstada caso a pessoa jurídica
deixe de pagar o tributo sem o amparo de uma medida judicial.
Considerando a situação econômica do
contribuinte, elabore a medida judicial adequada para a impugnação do novo tributo e a garantia da certidão de
regularidade fiscal necessária à sua participação na licitação, considerando a
desnecessidade de dilação probatória e indicando todos os fundamentos jurídicos
aplicáveis ao caso.
De plano, deve-se
atentar ao fato de que, no enunciado que a questão aborda uma situação na qual
na norma Jurídica (in casu um
decreto) já foi publicada gerando
efeitos concretos, o que pode ser compreendido a partir do trecho do enunciado
onde se lê “A taxa passou a ser exigível a partir da data da publicação do
decreto que a instituiu” – tal destaque é importante para afastar o estágio da
“lei em tese”, o qual como sabemos não comporta manejo do Mandado de segurança,
nos termos da Súmula 266, STF, cujo teor é obtuso: “Não cabe mandado de
segurança contra lei em tese”.
Despiciendo e descabido
aqui discorrer sobre as Súmulas, bem como o teor do significado sobre o que
seria “lei em tese” – isso seria tema pra outro texto – fiquemos pois com a
simplória e dogmática afirmativa de que a hipótese do enunciado já não é mais
“lei em tese”, logo é cabível sim o Mandado de segurança ou uma ação anulatória
com pedido de antecipação de tutela.
A dúvida contudo é
dirimida com outro trecho do enunciado da questão que termina por afastar a
ação anulatória e deixar claro ser o Mandado de segurança a peça cabível quando
a questão indica: “desde que sem o risco
de suportar os custos de honorários advocatícios na eventualidade de insucesso
na demanda” . Em outras palavras, o examinador
pede uma das ações onde não existam honorários advocatícios.
Ora, como se sabe a
ação anulatória é uma ação de rito ordinário, sendo perfeitamente cabível a
condenação em honorários advocatícios, já o mandado de segurança, a seu turno,
não existe tal possibilidade, seja por expressa previsão legal (art.25 lei
12016/09) seja pelo teor da Súmula 512, STF ou a Súmula 105, STJ já que ambas
tem mesmo teor do artigo citado.
Ademais, além da
questão da questão dos honorários, o Examinador exige que o meio processual
escolhido considere “a desnecessidade de dilação probatória”, afastando assim definitivamente
a ação anulatória, a qual, como já afirmado alhures tem rito ordinário,
comportando portanto ampla dilação probatória.
Identificada a ação
resta saber quais dos dois tipos de MS seria o adequado, o repressivo ( quando
a coação já foi praticada) ou preventivo ( quando a coação está por acontecer).
Nesse sentido, mais uma vez o próprio enunciado da questão é muito claro,
quando diz: “Dez dias após a publicação
do decreto (antes, portanto, da data de recolhimento da taxa)”.
Ora... se é antes da
data de recolhimento, é sinal que esta ainda não foi cobrada, logo a coação
ainda não foi praticada, mas será em dez dias. Logo, cabível será o MS em sua
modalidade preventiva, face a coação que será praticada no futuro próximo.
Por
fim, resta destacar também o trecho do enunciado da questão onde se lê:
[...] tendo em vista que pretende
participar de processo licitatório em data próxima, para o qual é indispensável
a apresentação de certidão de regularidade fiscal, a qual será obstada caso a
pessoa jurídica deixe de pagar o tributo sem o amparo de uma medida judicial.
Neste trecho, o Examinador deixa claro a necessidade de que o candidato fizesse uso de uma das causas de suspensão da exigibilidade do crédito (art. 151, CTN), com vistas a obstar uma execução fiscal, bem como obter uma CDA positiva com efeitos de negativa (art. 206, CTN), com vistas a permitir que o contribuinte possa participar do processo licitatório. Tal causa seria um pedido de medida liminar (art. 151, IV, CTN), o que terminaria por complementar o cabimento da ação por um Mandado de segurança preventivo com pedido de medida liminar.
Consoante se pode observar, o cabimento da ação no exame da OAB não é um jogo de “adivinho”. Não é um “tiro no escuro”... O Examinador dá todas as “dicas” da ação que se espera seja manejada, cabendo assim ao candidato, de posse obviamente de razoável domínio dos pontos basilares de cada meio judicial à defesa do contribuinte (como estes que citei acima) identificar a peça, sua base legal e elaborar a petição.
Quanto ao mérito da peça, o direito líquido e certo do contribuinte é violado pela violação ao princípio da legalidade tributária (art. 150, I, CF), que impede que os tributos sejam criados por decreto, como no caso do enunciado da prova. Além deste, há também violação aos princípios da anterioridade e noventena (Art. 150, III, b e c, da CF), uma vez que a o tributo é cobrado imediatamente após sua criação.
Por fim, cite-se ainda que o serviço de segurança pública é do tipo indivisível (UTI universi) sendo descabido seu custeio por meio de taxas que, como se sabe tem como fato gerador a prestação de serviços públicos específicos e divisíveis (UTI singuli) nos termos preconizados pelo art. 145, II, da Constituição.
Foi portanto uma questão fácil, aos aprovados meus
parabéns.
[1] Milton Vasconcellos é Advogado, pós graduado em Direito Público
(FABAC) e Professor de Direito Tributário bem como de Hermenêutica da Faculdade
Apoio Unifass.
Realmente Milton, aos teus alunos de tributário I e II teríamos condições de realizar a peça cabível principalmente no que tange a questão material , pois de certo que aprendemos contigo em sala de aula!!!Parabéns a quem acertou!!!
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